terça-feira, 5 de agosto de 2008

Parte VII – Ato Derradeiro

[Aviso leia a partir da Parte I - Préludio da Luz]



A formação de nuvens sobre suas cabeças trepidava entre raios e trovões. A ventania se intensificava a cada segundo. O céu parecia rugir de prazer ao continuar da batalha de Acácio e Nith-Haiah. Somente raios iluminavam a arena do Cáucaso. Cada raio fazia abalar a estrutura de mármore sagrado. As correntes se moviam aleatoriamente, ressoando morte em suas notas falidas. No meio de toda esta tormenta Acácio e Nith-Haiah se encaravam estáticos pela eletricidade. Seus olhos eram portais indignos de piedade. Cada um deles clamava por um retorno bestial. Seus lábios se moviam como cobras em uma tocaia, podiam farejar e sentir a vítima. Queriam atacar. Sentir o ódio na veia e cuspir o veneno contido nos versos.

Acácio se levantou depois do último trovão, fora o mais forte que ouvira em toda sua vida. Passara bem próximo de sua posição. Era um sinal que natureza exigia um desfecho a esta batalha. Ele não podia permitir que mais milênios de opacidade mental fossem proferidos a humanidade. Avançou como um felino faminto por vingança no peito de Nith-Haiah.

Nith-Haiah tremia. Sentia que seu inimigo se fortalecia a cada novo raio quebrado no solo do Cáucaso. Estava sem seu elmo e sua espada. Sentia-se cada vez mais fraco longe de seus itens. Foi tomado por um dreno mortal de sua força espiritual. Seus objetos sacros, seus valores estavam contidos em seu simbolismo. Tinha que unir forças donde nunca imaginara ter que tirar.

Com um baque forte Acácio agarrou aos ombros de Nith-Haiah. Prendeu os braços sobre os ombros do anjo e suas pernas se apertaram contra a cintura metalizada.O anjo foi tomado de surpresa sua mente se afastara da batalha e sobre a chuva forte o mortal o atacou silenciosamente. Acácio começou a puxar com muita força as parte da armadura do anjo. Ao menor movimento sentiu o cheiro de carniça úmida sair da armadura. Nith-Haiah agarrou Acácio com os braços formando um laço de união-repulsante entre os dois. Seus olhos se chocaram. Faíscas no céu anunciavam o fim. O anjo saltou e num bater de asas perfurava a chuva como uma flecha de Eros perfura o coração dos fracos. Acácio se deixava render pelos ventos e pela enxurrada de prazer. Prendeu sua mão nas ombreiras prateadas do anjo. O anjo começou a se mover em queda livre. Apontava sua cabeça em direção ao chão de mármore. Seu destino sacrificar-se pelo fim de uma batalha tão tormentosa quanto as chamas do inferno. Acácio forçou as ombreiras do anjo e as retirou. Os olhos de Nith-Haiah se arregalaram de temor pelo mal exposto. Acácio pode sentir o medo exalar da pele exposta do anjo. Não era uma pele qualquer mas uma pele em processo de decomposição elevado. Como uma feridad e lepra nunca cuidada e desenvolvida por séculos. Com uma velocidade impressionante e força descomunal Acácio afundou sua não no ombro de Nith-Haiah buscando seus órgãos internos. Conseguiu romper o tendão do braço esquerdo do anjo. Fazendo seu braço falecer com um rato envenenado. Sem um braço prendendo-o saltou as costas do anjo que delirava de dor. Sua velocidade em direção ao chão aumentava a cada instante o encontro fatal era iminente. Acácio novamente aprofundou seus braço contra a ferida exposta. Tentou alcançar o coração do anjo. Conseguiu. Alcançou uma estrutura espinhosa e pulsante dentro do peito de Nith-Haiah. Puxou com toda sua força. Feriu sua mão nos espinhos da carne podre que tentava puxar para fora do corpo angelical. Alçou sobre sua cabeça o troféu pútrido e encharcado de sangue. Seus cabelos balançavam muito contra o vento forte e a chuva torrencial. O Anjo agora caia sem rumo em direção a seu fim. Uma poça de água dos céus chamuscada pelo seu próprio sangue o aguardava no mármore. Chamativa e voraz tinha pressa em devorar seus demônios.

O impacto foi cataclísmico. Uma grande porção de água se levantou em torno dos dois corpos que caiam do céu. O tempo parou e assistiu o fim de uma batalha intransigente. Os raios pararam. A chuva terminou de cair em forma de vapor denso sobre cume do monte Cáucaso. Depois do impacto tudo se silenciou. Um único vulto mancou para frente da nuvem de vapor. Acácio saiu dela. De cabeça baixa e com o coração de Nith-Haiah em suas mãos. Ergueu as mãos aos céus. Uma grande águia negra aproximou dele. Jogou o coração aos céus que foi apanhado pela águia. Que num único movimento o devorou inteiro.

- Brinda comigo a morte de seu amo. - Acácio sorria enquanto olhava para a águia. - Devora tuas partes vitais. Para que as transformem em fezes que os mortais as repugnem. Chega de ideologias mortas. Que a chama da Realidade volte a brilhar junto de seus portadores. Transportá-la-ei aos mortais. Mostrarei as feridas adquiridas numa batalha contra um leproso milenar. Tirar-lhe-ei a venda púrpura. Mais um mundo a revelar.

Palmas eram ouvidas de algum lugar do palco de mármore. Acácio virou-se para encontrar quem emanava este som. Achou. Um sorriso demente surgiu em sua face suada.

Continua....

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Parte VI – Sangue Divino

[ Aviso leia a partir da Parte I - Prelúdio de Luz]


Nith-Haiah bateu as asas com força e partiu para cima de Acácio. Ele mal teve tempo de respostas, mas conseguiu esquivar-se jogando o corpo para o lado direito. Rolou no chão de mármore e levantou-se sorrindo. Seus olhos dementes sorriam também.

- O que houve? Por acaso se sentiu ofendido com minhas palavras? Acho que seria mais fácil me lançar na fogueira, do que gastar seu suor sagrado em uma batalha.

A espada longa do anjo trepidava. Seus olhos pareciam abismos que baforavam chamas sagradas.

- Mortal respeite-me. Pois seu destino esta cravado naquelas correntes. Não posso permitir que continue a ofender minha doutrina desta forma. Minha missão é bem o inverso da tua. Não posso permitir que almas, como a tua, levem este fogo maldito até os mortais. Eles não possuem capacidade de assimilação. Seria tudo demência.

Acácio gargalhou. Uma gargalhada doente. Com sílabas dementes e tons malignos. Sua cabeça se projetava para frente com os ombros tornados para frente, e mão fechadas próximas ao peito.

- Pronto vem me dizer que a loucura é um dos caminhos para iluminação. Pode ser até um atalho. Mas não um ponto de chegada. A humanidade não precisa de loucos concisos em suas idéias. Muito menos de ídolos demagogos. Precisa de heróis ocultos. Anti-heróis destruidores da moral. Construtores de uma novo caminho.

- Este caminho não é um caminho certo. Os tijolos estão frescos ainda. Quem caminhar por este caminho afundará nos próprios passos.

- Quem sabe mais alguns do meu cacife podem fornecer o calor para que os tijolos sequem e caminhemos seguros?

Nith-Haiah congelou os olhos em Acácio depois destas palavras. Sentia pela primeira vez um sentimento proibido. Suas asas pediam. Seu corpo entrava em ressonância com o centro da terra. Líquidos voláteis corriam dentro de seu corpo. Uma imagem apagada em sua mente. Vôo contra Acácio. Com o escudo contra o peito e a espada posicionada como uma lança sobre ele. Acácio abriu o peito, viu sua imagem refletida no escudo do anjo, e lançou-se contra o escudo. O impacto foi abafado por um raio que caiu sobre o cume do monte Cáucaso. Uma chuva torrencial iniciou. Acácio foi ferido no ombro esquerdo. Mas conseguiu se prender no escudo e alçar vôo junto do anjo. Jogou o peso de seu corpo para o lado direito e tentou prender-se nas asas do anjo. Falhou. Pois quando projetava-se no ar para realizar o golpe sofreu um empurrão do escudo do anjo. Caiu no chão molhado de costas. Gotas pesadas caiam ao lado de seu rosto. Seu cabelo molhado cobria parte de sua face. Mas não escondia sua expressão de dor. Começou a se levantar. Um novo raio. Um bater de asas. Ajoelhado ainda levantou sua cabeça. Encarou o anjo nos olhos. Gotas cortavam seu olhar. Elas estalavam na armadura de Nith-Haiah. Produziam o som de tambores de guerra. Aclamavam por batalha. Destino. Acácio explodiu como um tiro em direção ao anjo. Suas mãos em forma de garra mostravam toda a força invocada naquela ação. Não tinha como esquivar-se. Grudou no peito do anjo como um gato irritadiço. Golpeou seu elmo com força provocando pequenas deformações. Fora facilmente retirado pelo anjo, e jogado a uma distância de dez metros. Arqueou os olhos. Tinha que pensar em algo mais inteligente. Analisou o terreno. As colunas de mármore. Havia uma a suas costas. O anjo avançou contra Acácio. Acácio o deu as costas e começou a correr em direção a coluna. Saltou e deu dois passos verticais sobre ela e jogou seu corpo em lopping contra o anjo. No ar de cabeça para baixo surpreendeu Nith-Haiah e agarrou-lhe o elmo e o retirou. Fazendo-o quicar longe dos alcances do anjo. Os cabelos loiros de Nith-Haiah se soltaram no ar, uma pseudo-aura dourada surgiu em torno de sua cabeça. Acácio o encarou de frente, pela primeira vez sem o elmo. A face do anjo era doce e terna. Mas não cairia em mais uma armadilha do destino.

- Mortal devolva-me isto agora. Não sabe do que sou capaz!

- Nem você anjo. Vai pegar cachorro de ideologias mortas na idade média.

O anjo avançou vorazmente contra o elmo. Acácio o bloqueou no ar usando seu antebraço, descrevendo um arco que acertou em cheio o queixo do anjo. Interrompendo o vôo de Nith-Haiah. Neste momento Acácio avançou contra o anjo, puxando-o pelos cabelos. Dando-lhe uma joelhada no nariz. Quebrando-o. Sangue divino escoria no mármore do Cáucaso. Acácio tomou a espada do anjo. Os olhos de Nith-Haiah se arregalaram. A espada era pesada e sentiu um pequeno choque ao manuseá-la.

- Hum...Quantos mortais foram mortos por tentar criar opinião? Esquisito alguns pregam a bondade e caridade, mas não receiam em matar seus inimigos, ou mesmo, aqueles que podem atrapalhá-los.

Acácio olhava fixamente para a espada ao descrever pequenos arcos no ar. Podia ver raios de paz saírem da espada. A chuva se intensificava. Os trovões se tornavam mais fortes.

O anjo, durante o som de um trovão, puxou com força o calcanhar de Acácio. Fazendo-o cair de boca no chão. Um estalido de dor. Acácio mais que rapidamente golpeou com a espada na direção de seu inimigo. Que usou seu antebraço como armadura. Faíscas formaram-se no ar. Um raio caiu bem próximo dos dois que duelavam no chão. Acácio conseguiu se levantar e arremessou a espada para bem longe do alcance dos dois.

- Encara-me sem armas. Venhas nu. Pois suas armadilhas não funcionam comigo. Sou a dinamite da tua casa. E o mármore da nova ordem. Cuidado, posso ser bom e verdadeiro. Agora tem medo?

- Mortal cala-te. Não passas de um figurão da “nova ordem”. Mais um que o poder sobe-lhe a cabeça e acha que podes vencer algo milenar. Sou a força do maior medo dos humanos. A morte. Então caso convença alguém que não deve temer a morte pode me tirar as forças, caso contrário este anjo é o seu fim. Padecerá sobre os olhos ternos da bondade.

Acácio sorriu. Nith-Haiah sorriu. Molhados pela chuva se encaravam entre gotas pesadas. Cada um deles era um rio. Efêmeros. Correntezas estavam dispersas em suas mentes. Marcavam tudo por onde passavam. Carregavam consigo sedimentos das partes mais altas e tendiam a levar tudo para parte mais baixa. Tinham uma só função aumentar o caos. Bendita entropia humana. Dois raios. Um som. Silêncio.

Continua...