segunda-feira, 28 de julho de 2008

Parte IV - Respostas

[Aviso: Continuação de Parte III - Diálogos. Leia os post anteriores, A partir de Parte I - Prelúdio da Luz]


Encarou a carta. Projetou um leve sorriso de sarcasmo e ódio. Caminhou na ponta dos pés até ela. Respirou a luz escarlate projetada por ela. Seus olhos se tornaram dementes ao encarar as letras como demônios adormecidos. Tudo era trevas a sua volta. Estava só com suas dúvidas. Seus olhos projetaram um facho de luz virgem. E suas mãos se fecharam em sinal de força. Seus músculos rugiram. Veias projetaram-se em seus braços. As pernas se posicionaram para o ataque. Não havia defesa, era ataque. Audaz e direto. Sem direitos a meias palavras. Sem fuga. Sem vida.

- Demônios de eras antigas que se projetaram contra mim. Encara agora teu novo inimigo. Mais puro, mais forte, mais dúbio. Acima de tudo um não-deturpado por teus vícios.

Eles os cercaram. Eram centenas. Pequenos, trêmulos, frívolos e quentes. O cheiro de enxofre encorpou-se no ambiente. Eram cães. Hominídeos. Alados pútridos. Estavam em todos os lados. Sorrindo. Queriam sua carne, seu cerne. Caminhavam com passos calmos, cercando-o. O ataque aproximava-se. Seriam astutos. Imperdoáveis.

No centro da roda viva de demônios Acácio esta em pé. Em posição de ataque. Mãos fechadas. Olhos dementes. Sorriso dúbio. A batalha pela resposta começaria, e como a anterior mortes eram inevitáveis.

- Cogito, ergo sum? Agora suas palavras me fazem sentido. Vocês demônios tentaram tampar-me com o véu negro da mentira. Mas deste véu me dispersei. Agora passo a pensar e conseqüentemente existir. Deveriam muito antes definir o que serias o pensar, mas vocês tentaram condicionar-me. Não mais. Não vou mais aceitar acondicionamento passivo. Como eu antes pudera saber o real sentido da existência se era um lacaio de vossas idéias? Éramos todos paralíticos, incapazes de agir. Destruo a minha prisão. Parto para novos horizontes, sem seu consentimento.

“A resposta para esta questão seria somente uma. Sim. Mas são poucos iluminados que podem existir. Conhecer o abismo mais temido? Por isto estou eu aqui para encará-los e abrir as portas do novo pensamento. A nossa existência depende sim do pensamento, que por muitas gerações fora trancado em jaulas de ideologia e conspirações transmitidas por ondas eletromagnéticas. Temos que abstrairmos da condição de existência imposta e encontrar a Realidade. Derrubando nossos ídolos e matando nossos demônios.”

Os demônios tornaram-se agitadiços. Gritaram. Centenas de vozes infernais, agudas e pútridas berravam. Um cântico apocalíptico. Acácio sorria. Feri-los-ia com suas palavras. A primeira horda de demônios alados atacou. Dezenas de demônios alados, asas com grandes furos e formato de morcegos, partiam com suas presas exibidas e reluzentes buscando dilacerar a carne da verdade. Os olhos de Acácio eram um farol de luz virgem irradiante. Por onde passava seus olhos demônios caiam agonizantes. Expeliam fumaça de seus corpos, berravam de dor. Suas feições clamavam piedade. Os que se esquivavam de seus olhos eram golpeados com a mão forte da marreta. Girava em torno de si e golpeava com ardor, fazendo os demônios caírem com os ossos quebrados no chão. Um único demônio prendeu-se nas costas de Acácio. Encravando as presas. Um grito de dor. Suas carnes eram novamente penetradas por agulhas de mentira e hordas de niilismo. Seus olhos arderam em luz virgem. Todo o ambiente iluminou-se. Os demônios tamparam os olhos, esbugalhados de pânico, com suas mãos secas. Acácio agarrou o demônio atacante de suas costas. Pressionou sua garganta fortemente. Cegou-lho com seus olhos-faróis. O bafo de enxofre ficara insuportável com tamanho grito. Com a outra mão agarrou-lhe pelos pés. Um movimento só foi necessário. Com um puxão para lados opostos o demônio foi repartido. Cinzas a mais cinzas de enxofre encheram então a sala. De joelho Acácio levantou seu mais novo troféu e ainda com o sorriso no rosto arremessou o corpo para seus companheiros.

A primeira parte do conflito já tinha sido vencida. O conflito epistemológico da realidade fora concluído. Deveria agora entender a natureza da matéria como ser.

Metade dos demônios já havia caído por terra. A outra metade aguardava sedenta pelo momento ideal do ataque. Os olhos de Acácio analisavam o novo ambiente, menos pútridos, mas com densidade de ódio igual.

- Agora temem lacaios da mentira? Já sabem que não sou mais o todo fraco, dominado. Agora devo buscar o sentido da vida na matéria. Todavia o que fazem você aqui, não são matéria? São abstrações, éter do além. O humano, matéria, tem o poder de pensar quando ele foge de suas artimanhas. Amontoados de átomos agindo. Buscando explicações metafísicas para a realidade adulterado por suas ideologias. A matéria age. E por finitude de vossas capacidades o supera. Da pedra mais profunda sepultada no inferno ao vapor dos céus, a matéria pensante guia os destinos da natureza. A natureza clama por vosso salvador, estou aqui para destruí-los e mostrar os caminhos da verdade. Não somos amontoado de matéria inerente, somos Vida. Comecem correr, pois a vida ressurge das tuas trevas para encontrar seu novo caminho.

Acácio saltou, com os braço e pernas estendidas. Uma explosão de luz, todos os poros de seu corpo transpiravam a radiação virtuosa. O pânico foi instalado no ambiente. Luz cada vez mais intensa, mais pânico. A verdade transparecia, era forte demais para ser aceita. Os demônios fugiram. Restando somente cinzas de resistência. Todo o ambiente tremeu. As paredes explodiram, e uma esfera formou-se sobre Acácio que ainda plainava no centro. Essa esfera começou e se comprimir. Estava entrando em colapso. Um coração pulsante. Repulsante. Incerto. Uma última agitação. Uma nova explosão. Fragmentos negros ficam dispersos pelo ambiente claro formam uma nuvem de poeira. Desta poeira surge Acácio. Intacto. Mais forte. De peito triunfante e olhos sedentos.

Continua....

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